segunda-feira, setembro 05, 2011

Fazendo o dia ficar mais claro

Lanterna Verde, primeira iniciativa da Warner para combater o sucesso do universo integrado Marvel nos cinemas, foi alvejado cruelmente pela crítica – tanto a da massa, quanto a dos fãs. Mas será que o filme tem tantos problemas assim?

Em primeiro lugar é preciso contextualizar o personagem. O Lanterna Verde como um policial intergalático nasce na década de 1960. Ele é um dos primeiros super-heróis a iniciar a chamada “Era de Prata” dos quadrinhos, ao lado do veloz Flash. Naquele momento, como bem conta Grant Morrison em Supergods (2011), o piloto de teste Hal Jordan, identidade secreta do herói, representa o ideal norte-americano da corrida espacial. É o piloto destemido que recebe dos céus a missão de ser o protetor do modo de vida tido como correto, justo e ordeiro. Policial pleno daquela realidade. Qualquer semelhança com o posicionamento dos EUA na Guerra Fria não é mera coincidência.

O que então faria um personagem como aquele se tornar relevante para a audiência de hoje, que nasceu num mundo em que o Muro de Berlim não passa de uma alegoria num livro de História? A resposta estava mais perto do que poderia se imaginar: dentro do coração do homem contemporâneo, refém de sua condição fragilizada e amedrontada face ao novo mundo de novidades constantes e igualdade plena dos sexos, continentes, mercados e tudo mais. Um mundo pós 11 de setembro, no qual o medo é presença constante.

Pelas hábeis mãos do hoje Chief Creative Officer (algo como “chefe criativo”) do Universo DC, o então “apenas” escritor Geoff Johns, os Lanternas Verdes se configuraram como a representação da Força de Vontade, acompanhados agora por uma miríade de cores, cada uma indicando um sentimento ou condição humana. No filme, temos apenas o encontro com o Amarelo do Medo e o próprio Verde. Mas os quadrinhos nos apresentam ainda o Vermelho da Ira, o Azul da Esperança, o Índigo da Compaixão, o Laranja da Ganância, o Violeta do Amor, além do Negro da Morte e o Branco da Vida.

Se todas essas cores serão vistas nos próximos filmes, só tempo dirá. Fato é que Hal Jordan passa a ser o homem destemido, que consegue moldar a realidade a partir de sua vontade. Desejo interno de qualquer um.
As críticas mais pesadas acusaram o filme de ter vilões fracos, a saber: o telepata Hector Hammond e a entidade do medo, Parallax. Mas haveria algo maior para ser enfrentado do que o medo em si? Talvez a representação imagética de Parallax não tenha sido a melhor possível. Ele, basicamente, é uma nuvem com rosto e tentáculos. Nos quadrinhos é um ser de aspecto reptiliano. Talvez funcionasse melhor na tela do que a tal nuvem, mas o que estava em jogo era o conceito, o ideal de superar o medo. Ou, como o filme bem coloca, de aceitar que ele existe para então ser capaz de suplantá-lo.

Em termos cinematográficos, os efeitos oscilam demais. A arte conceitual do planeta-sede da Tropa dos Lanternas Verdes, Oa, é magnífica. E funciona ainda melhor em 3D. Os personagens criados por computador para fazer parte da Tropa também são bons. Mas algumas cenas de batalha espacial deixaram a desejar.

O maior problema, no entanto, não é esse. A questão é que o roteiro de Lanterna Verde fica no meio do caminho entre ser uma ópera galáctica, nos moldes de Star Wars e uma fita de super-herói mais tradicional, como o recente (e excelente) X-Men First Class.

Entre tentar aproximar o público com cenas passadas na Terra ao invés de investir mais em aprofundar os conflitos internos de Hal Jordan, um homem atormentado pela lembrança da morte de seu pai e pela vontade de realizar aquilo que ele deixou por fazer, o filme perde a oportunidade de gerar ainda mais empatia junto à audiência.

Mas isso não faz com que seja um filme ruim. Longe disso. É divertido e interessante, com atuações bastante equilibradas. Ryan Reynolds, que faz o papel-título era um dos grandes temores da comunidade de fãs. Conhecido por papéis “engraçadinhos”, na pele de Hal consegue transparecer a impetuosidade característica do personagem, conferindo ainda uma certa graça a todo o processo. Evidente que não se trata de um ator da categoria de Robert Downey Jr e seu Homem de Ferro. Mas é superior ao Thor de Chris Hemsworth e ao Capitão América de Chris Evans. Já a mocinha vivida por Blake Lively, adorada pelas adolescentes por sua Serena de Gossip Girl, convence como a forte Carol Ferris, dublê de piloto e executiva.

Mas o grande destaque do elenco vai para os antagonistas.

O Sinestro de Mark Strong é duro, viceral, um representante da ordem pronto para buscar o domínio completo. A todo momento já se vê o futuro líder da tropa que leva seu nome e que espalhará o medo pela galáxia. Já o Hector Hammond de Peter Sasgaard tem um olhar triste, sofrido. Um outcast completo, que busca na ciência a chance de sobressair de alguma maneira. Se a medida de um herói é dada pelo tamanho de seus opositores, o Lanterna Verde já consegue se posicionar bem. Mas, pelo que indica o filme, ficará ainda melhor quando tiver Sinestro como seu principal opositor.

Lanterna Verde é melhor do que a maioria das críticas pintou. Para os fãs, não há muito que reclamar, pois a fidelidade ao material original é enorme. Mas se a DC (e a Warner, sua proprietária) querem criar um universo capaz de rivalizar com a Marvel e seus Vingadores vindouros, é preciso trabalhar um pouco melhor.

Independente disso, a grande virtude do filme é ser puramente divertido. Sem a densidade de Batman - The Dark Knight. Lanterna Verde é aquele filme que faz as crianças quererem colocar anéis nos dedos e enfrentar o escuro de seus quartos. Num mundo como o nosso, isso já faz o dia brilhar muito mais claro.